domingo, 29 de janeiro de 2017

O poder, os media e a denúncia

Um Inimigo do Povo (En folkefiende) é a peça de teatro do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen representada por Pedro Gil (dr. Stockmann), Isabel Abreu (sua mulher), Filipa Matta (a sua filha mais velha, a iniciar a carreira de professora primária), o intendente da cidade, João Pedro Vaz (Peter Stockmann, irmão do dr. Stockmann), e dois jornalistas de O Mensageiro do Povo, Tónan Quito (Hovstad) e Miguel Loureiro (Billing).

A leitura e discussão do texto começou em finais de 2014 em Montemor-o-Novo. Tónan Quito assinaria a direção artística, a par da de ator. O primeiro ensaio decorreu no Espaço Alkantara (Lisboa). A peça centra-se na estância balnear, a principal fonte de riqueza da cidade, e na descoberta da contaminação do sistema de água. O médico quer denunciar a situação mas o intendente e presidente da estância opõe-se, porque a estância ficaria paralisada e o investimento seria incomportável, além da perda de empregos provocada pela paragem.

O chefe de redação do jornal O Mensageiro do Povo e o responsável da tipografia, que representa a sociedade dos pequenos proprietários, estão a favor da revelação do mal, porque a denúncia faria vender mais jornais e porque o poder político local seria renovado. Mas uma visita apropriada do intendente faz mudar de opinião os elementos do jornal e a maioria sólida de apoio ao dr. Stockmann perde-se.

A segunda parte da representação projeta os argumentos dos irmãos. A pergunta é: quem está no poder é sempre mau e quem descobre a verdade é bom? A realidade parece ser mais complexa. A verdade proclamada pelo médico é justa mas acarreta a destruição da economia e da sociedade da cidade. Há um segundo tema na peça: a posição da mulher, subalterna no casal, mas que quer assumir uma posição de liderança quando vê o marido ser traído pelos jornal local. A filha, como já estudou e tem uma profissão, representa um passo na evolução da posição feminina.

No fundo, o texto tem uma grande atualidade, ao mostrar os jogos sociais do poder e de ocultação de factos e objetivos. Discussões familiares, corrupção, manipulação política, assembleias populares e apedrejamentos são algumas das consequências. A administração da estância despede o médico, o senhorio despeja a família da casa onde vivem. Mas o sogro, personalidade que não aparece na peça, compraria todas as ações da estância e dá-las-ia ao médico, que passa a ter toda a força na empresa da estância. O novo poder é solitário, diz o médico.

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